sábado, 9 de outubro de 2010

Professor não é táxi

Em pouco mais de uma década, o governo federal conseguiu colocar virtualmente todos os jovens nas escolas de educação básica. Mas ter alunos em sala de aula não significa que nosso país também conseguiu melhorar a qualidade do ensino, um dos grandes desafios para os próximos governos. Vejo, cada vez mais, que os jovens hoje não querem ser professores, por ser a profissão bastante desvalorizada no que se refere às questões salariais e também à autonomia profissional. Um professor, hoje, ganha 60% do salário de um profissional de outra área com a mesma escolaridade. Isso significa trabalhar, no mínimo, em duas escolas e atuar em outro turno em casa, preparando aulas, corrigindo avaliações. Em algumas regiões do Brasil, para compensar o baixo salário, professores trabalham em quatro escolas, até à noite. São chamados "professores-táxis".
Que autonomia profissional esperar de quem não tem tempo de se envolver em outras atividades promovidas pela escola? Quando e como esse professor se atualiza ou dedica tempo à família e ao descanso? Um debate sobre a profissionalização docente movimenta o cenário da educação com o projeto de lei nº 280/09, que prevê a exigência da formação superior para professores que atuem na educação básica. Muito além disso, os docentes em geral não participam de programas de atualização ou formação. O aperfeiçoamento se faz com estudos com seus pares, no local de trabalho. Um esforço quase impossível, mesmo para quem não é um professor-táxi.
Uma solução seria a instituição de políticas públicas que reorganizassem o tempo e o espaço escolares: o professor trabalha numa única escola, tem tempo de discutir com seus colegas sobre os problemas do fazer cotidiano e desenha soluções didático-pedagógicas. Especialistas e acadêmicos escrevem artigos e livros sobre as competências que um bom professor deve ter. Para mim, os livros apresentam ideias interessantes, embora aos olhos de alguns professores possam ser bastante desestimulantes ou mesmo impossíveis. Tornar-se professor seria algo parecido com "ensinar às areias e aos gelos a primavera", parafraseando Cecília Meireles. Na realidade, vir a ser professor é um processo identitário complexo - leva tempo e mais tempo ainda para ser um bom professor.
Por isso, falamos tanto em formação continuada, que deve fazer parte da profissão docente e ser encarada como um direito e uma necessidade. Falta ao professor de hoje refletir mais, principalmente se ele puder agir na situação escolar. Um bom professor precisa saber ensinar, de diversas formas, a cada um e a todos os alunos, compreender formas singulares de ser no mundo e ampliar os conhecimentos, contribuindo, dessa forma, para a construção de uma escola inclusiva. Muitas vezes, nos cursos que coordenei, escutei: "Por que nunca aprendi isso na faculdade se é tão importante para ensinar?". A resposta, mais uma vez, está na reflexão da prática.

Por MARIA VIRGÍNIA FERRARA
fonte: http://www.udemo.org.br/

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